ilha de Ano Bom
O
Fá d'Ambõ
Fala da ilha de Ano Bom
Quando da última cimeira da CPLP a
Guiné Equatorial pediu a adesão a essa comunidade. Houve quem estranhasse.
O facto é que este país tem mais
afinidades com Portugal do que com Castela, a sua última potência colonizadora.
Os Portugueses foram os primeiros
europeus a chegar à região, em 1471, a povoar nomeadamente as ilhas de Fernando
Pó ( actual Bioko)e Ano Bom ( Annobon).
Tanto as ilhas como a parte
continental pertenciam a Portugal, mas foram trocadas pela região que hoje é o
Rio Grande do Sul , no Brasil.
- Foi pelos tratados de Santo Ildefonso (1777)
e do Prado(1778) que os Castelhanos renunciaram à ilha de Santa Catarina
(Brasil) e aceitaram a fronteira do Sul do Brasil, tal como hoje ainda existe;
os Portugueses renunciaram a Sacramento (Uruguai) e aos direitos sobre as ilhas
Marianas e as Filipinas - .
ilha de Ano Bom
Foi por esses tratados que foi feita
essa troca.
A troca não foi aceite pelas
populações e derem "água pela barba" aos de Castela.
Essa é uma das razões porque hoje se
fala o Fá d' Ambõ, um Português quase
medieval, em Ano Bom.
O Fá d'Ambõ é um património imaterial
da lusofonia, de valor incalculável, pois conserva as características originais
da língua mãe.
Foi devido à sua resistência e ao
isolamento a que estiveram sujeitos durante alguns séculos , que ainda se fala
o idioma dos primeiros povoadores.
Luís Santana
Comentários de interesse:
Etelvina Ferreira
Há dias estive a ler sobre o Tratado
de Madrid assinado a 14 de Fevereiro de 1750 e sobre o" mapa das
cortes" de 1749, construído habilmente em Lisboa por Alexandre de Gusmão.
Perdemos Sacramento mas ganhamos mais
território graças à habilidade negocial do Visconde de Vila Nova, Tomás da
Silva Teles e José de Carvalhal e Lencaster e às provas que então tinham sido
preparadas para as reuniões, nomeadamente os mapas
Património Português no Mundo não sei
se ganhamos território?
Perdemos Ano Bom e Fernando Pó, a
parte continental da actual Guiné
Equatorial, Sacramento, os
territórios anexos de Santa Teresa e
São Miguel, e os direitos sobre as Marianas e as Filipinas. Olhe que não sei...não.
Houve realmente um emparcelamento no Sul
do Brasil, mas não sei se recompensou. Pelos menos em meus humanos foi
constrangedor, já que como disse, os povos da Guiné não aceitaram autoridade
dos Castelhanos, fizeram guerra e conseguiram que fossem nomeados cinco nativos
como governadores, mas depois de muita luta.
Etelvina Ferreira
Pelo menos tudo foi feito pelos
negociadores para fazer crer que os territórios a ceder pelos portugueses
parecessem maiores que o que realmente eram. Os portugueses conheciam melhor o
território que os espanhóis, quer através dos mapas existentes, quer através
dos relatos orais. Anteriormente à assinatura do tratado os espanhóis não
tinham mapas elaborados em Espanha o que aliado a alguns lapsos nos mapas, e
que eram do conhecimento de Portugal, permitiu manobrar a causa portuguesa a
nosso favor.
Numa cerimónia realizada ontem (15),
durante o primeiro dia do Colóquio Internacional “A Língua Portuguesa, o
multilinguismo e as novas tecnologias das línguas no século XXI” foram lançados
o livro “Fa d’ambô: herança da Língua Portuguesa na Guiné Equatorial” e o livro
“ O Exame de Proficiência Celpe-Bras em Foco”.
Resultado de acção prevista no
Protocolo de Cooperação Técnica entre o Governo da Guiné Equatorial e o IILP,
em decorrência da oficialização da língua portuguesa naquele país, o livro “Fa
d’ambô: herança da Língua Portuguesa na Guiné Equatorial” apresenta as pesquisas realizadas em Março do
presente ano, em Malabo e Annobón, na Guiné Equatorial, bem como um panorama
histórico da emergência daquele crioulo de base portuguesa.
A missão no país foi dirigida por
Isabel Oyana Ayomo, na altura Directora Geral de Lusofonia da Guiné Equatorial,
tendo como pesquisadores de campo a Doutora Rosângela Morello, do Instituto de
Investigação e Desenvolvimento em Política Linguística (IPOL), coordenadora da
missão no terreno. A equipe local foi formada por Isabel Oyana Ayomo, Armando
Zamora Segorbe, linguista e professor da Universidade Nacional da Guiné
Equatorial, Anastasia Nansie Esono, licenciada em filologia ibérica e investigadora
no Centro de Estudos Afro-Iberoamericanos (CERAFIA) de Libreville, Bienvenido
Ebang Otogo, licenciado em Ciências Políticas e funcionário do Ministério de
Assuntos Exteriores na Direcção Geral de Lusofonia, Alicante Mba, oficial de
protocolo do Ministério de Assuntos Exteriores e Aparicio Sima e Diosdado
Echupo, jornalistas da TVGE.
Concentrando-se em Malabo e arredores,
de 10 a 18 de Março de 2012, e em Santo António de Palé, na Ilha de Annobón de
19 a 25 do mesmo mês, os investigadores realizaram diferentes acções visando
conhecer mais detalhadamente a situação linguística das comunidades
annobonenses, incluindo, por um lado, um trabalho descritivo da língua por eles
falada (constituição de corpora) e, por outro, os âmbitos de uso e de
circulação dessa língua, observando também a taxa de sua transmissão a jovens e
crianças (diagnóstico sociolinguístico).
A obra estará disponível em breve no
sitio do IILP.
Organizado pela professora Dra. Regina
Lúcia Péret Dell’Isola, da UFMG, o livro “ O Exame de Proficiência Celpe-Bras
em Foco” reúne uma coletânea de trabalhos que, sob diferentes prismas, levanta
uma série de reflexões acerca do exame Celpe-Bras. O objectivo é alimentar o
debate acerca do tema a partir de uma abordagem provocativa, que perpassa a discussão
sobre a qualidade do material do exame, a dinâmica da interacção face a face e
o desempenho do candidato, tanto na parte escrita quanto na parte oral.
Ilha de Ano Bom
https://www.revistamilitar.pt/artigo/1073 , por Tenente-coronel João José de Sousa Cruz
Tenente-coronel João José de Sousa Cruz,. História da Guiné e do seu Golfo
Acha-se situada em a latitude de 1
grau e 28 minutos meridionais, e aos 20 graus e 45 minutos de longitude do
meridiano da Ilha do ferro (Canárias).
[Dados do Google Earth: Latitude 1º24’51,49” Sul Longitude 5º37’04,75”Este (Greenwich)]
Diz-se que foi descoberta pelos navios
de João de Santarém e de Pedro Escobar em 1 de Janeiro de 1472 posto que Martim
Behaim no seu globo planisférico de Nuremberg declarasse ter sido encontrada
pelos navios de Diogo Cão no ano de 1484 ou 1485, isto no caso de ser a mesma
ilha de Ano Bom a de S. Martinho de que ele trata; é pequena e de figura quase
oval e extremamente montanhosa.
Foi erigida em capitania donatária de
juro e herdade a favor de Jorge de Melo. Gaspar da Silva segundo Capitão
Donatário foi casado com Dona Maria de Almeida e foram pais de D. Luísa da
Silva casada com António de Melo e tiveram a Dona Maria da Silva que casou com
Martim da Cunha d’Eça e estes: D. Maria da Silva casada com Pedro de Brito e
Ataíde. É isto o que eu encontro no Teatro Genealógico dos Grandes de Portugal
respeito de Gaspar da Silva; mas recorrendo às memórias mais autênticas e
circunstanciadas que pude alcançar achei um assento junto ao auto do Sínodo
Diocesano celebrado em S. Tomé no dia 15 de Junho de 1617 que unido a outras notícias
põem-nos ao facto do senhorio desta ilha.
Consta pois que durante o tempo de
Jorge de Melo, primeiro Senhor Donatário, ajustava com ele Baltazar de Almeida
morador na Ilha de S. Tomé povoar-se a ilha de Ano Bom como era obrigado pelo
título da sua doação. Baltazar de Almeida remeteu alguns casais para a mesma
ilha e seu sobrinho Luís de Almeida também morador em S. Tomé fez compra do
senhorio dela em 1570 a Jorge de Melo pela quantia de 400$000 réis com
permissão de El-Rei D. Sebastião. Este Luís de Almeida instituiu o Morgado das
Laranjeiras da ilha de S. Tomé e entre outras obrigações impostas aos futuros
administradores foi a de conservarem um sacerdote na ilha de Ano Bom, repararem
a igreja e terem os ornamentos que fossem necessários. Ao Morgado das
Laranjeiras achavam-se incorporadas umas propriedades de casas as quais ficaram
para residência dos Curas ou Vigários da Freguesia da Conceição que por isso
seriam obrigados a dizerem uma missa rezada em cada semana e um responso sobre
a sepultura de Miguel de Vasconcelos, irmão do referido Luís de Almeida que
estava enterrado na mesma igreja de N. Sª da Conceição. Como estas casas eram
de madeira foram abrasadas quando os holandeses incendiaram a cidade de S.
Tomé.
Luís de Almeida faleceu sem descendentes
e deixou a administração do Morgado das Laranjeiras a D. Maria de Almeida, sua
prima, em cuja linha andou até que foi sequestrada no dia 25 de Março de 1744 a
Martinho da Cunha d’Eça e Almeida, por falta de título legítimo para aquela
posse. Pelas memórias do Sínodo Diocesano de S. Tomé. mostra-se que D. Luísa da
Silva era moradora na vila de Soure em Portugal
Mui poucas são as notícias sobre o
antigo estado da Ilha de Ano Bom. No ano de 1598 o Capitão holandês Jacques
Maypay comandante de cinco navios que iam para a Índia saqueou a ilha. A
povoação principal tinha nesse tempo 20 casas. O Capitão continuou a sua viagem
no dia 12 de Dezembro. No ano de 1605 tornou a ser saqueada pelo Capitão
holandês Matalief. Existiam aí dois portugueses e 200 moradores pretos. Pelo
capítulo 42 do Regimento dos Governadores de S. Tomé, está determinado que aí
se conserve sacerdote para administrar os sacramentos aos habitantes, cuja
côngrua será paga pelo Donatário ou pelo Cofre da Fazenda Real. No ano de 1755 foi
nomeado Pároco Missionário Fr. Francisco Pinto da Fonseca, Freire da Ordem de
Cristo e irmão de D. Manoel Pinto da Fonseca, Grão Mestre da Ordem de S. João
de Jerusalém, mas como falecera foi nomeado em Setembro deste ano o Padre
Domingos Farias o qual não aceitando teve por sucessor o Padre Manoel do
Nascimento Pais e Oliveira, e apenas chegou este eclesiástico, sublevaram-se os
habitantes contra o mesmo e seus companheiros os quais para salvarem as vidas
foram obrigados s fugir da Ilha. Outro tanto aconteceu aos cónegos de S. Tomé
António Luís Monteiro e Gregório Martins das Neves, que ali foram por ordem do
Governo Português em companhia do Capitão Mor das Ilhas de Príncipe e S. Tomé
Vicente Gomes Ferreira e do Ouvidor Geral Caetano Bernardes Pimentel de Castro
e Mesquita, no dia 26 de Setembro de 1770. Os Cónegos não puderam conservar-se
na ilha por tempo excedente a um ano e quase sempre debaixo da mais cruel
perseguição daquele povo indomável.
O mais célebre acontecimento acerca da
ilha de Ano Bom foi a da entrega e posse que dela tomou a Coroa de Espanha em
virtude do Tratado de 11 de Março de 1778 e participado ao Capitão-Mor das
ilhas de Príncipe e S. Tomé em carta Régia de 2 de Novembro do mesmo ano, cuja
execução foi pelo modo que se segue.
No ano de 1778 chegaram à Ilha de S.
Tomé as Fragatas espanholas Soledade debaixo das ordens do capitão de Navio
José Varela e Ulhoa, a Santa Catarina comandada pelo capitão de navio Joaquim
Tapeta, um bergantim1 e uma charrua2. A bordo destes navios foi o Conde de
Argelar Brigadeiro do exército espanhol nomeado Governador Militar e Político
das ilhas de Ano Bom e Fernando Pó, cedidas a El-Rei Católico pelo sobredito
Tratado. O Governador de S. Tomé Vicente Gomes que não tinha recebido a esse
tempo ordens algumas da Corte de Lisboa para se fazer aquela entrega em que
acreditava por ver as cópias das cartas régias, que o Governo português lhe
havia dirigido, entreteve o Conde por algum tempo esperando que chegasse as
fragatas portuguesas com o comissário desta nação que devia fazer a entrega das
colónias ao espanhol; este Comissário era o Capitão de Mar e Guerra Bernardo
Ramires Esquível que depois foi substituído pelo capitão de Mar e Guerra Luís
Caetano de Castro, por motivo que ignoro. Algum tempo depois (em Julho de 1779)
(de) chegaram as fragatas3 espanholas deu fundo a Fragata Portuguesa N. Sª. da
Graça no fim do termo da viagem, comandada pelo dito Luís Caetano de Castro que
foi munido de plenos poderes para fazer a entrega. Nesta fragata ia o Governador
João Manoel de Azambuja. Os navios das duas nações largaram imediatamente para
a ilha de Fernando Pó, onde o Comissário e Governador espanhol Conde de Argelar
tomou posse da colónia. Daqui regressaram a S. Tomé e durante esta viagem
faleceu o conde de Argelar. De S. Tomé foram para a ilha de Ano Bom cujos
habitantes se opuseram à entrega o que deu motivo a retirar-se para a Bahia de
Todos os Santos, a Fragata portuguesa Graça cujo comandante deu parte ao
Governo de não quererem os espanhóis tomar posse de Ano Bom contra a vontade
dos moradores. Na ausência da fragata Graça voltaram os espanhóis à ilha
Fernando Pó, aí formaram o seu estabelecimento na enseada junto às ilhas Capras
e deram-lhe o nome de S. Carlos e porque lhes morresse muita gente voltaram para
S. Tomé. O Comandante da Fragata Graça recebeu na Bahia ordem para regressar a
S. Tomé e quando ia na viagem encontrou-se com a Fragata S. João Baptista
comandada por José de Sousa de Castelo Branco que lhe trazia ordens de Lisboa
para fazer efectiva a entrega da ilha de Ano Bom por qualquer modo que fosse.
Poucos dias depois da chegada em S. Tomé seguiram todas as embarcações para a
ilha de Ano Bom cujos habitantes vendo tão numerosa esquadra fugiram para os
matos e daí insultavam os espanhóis quando conheceram que a bandeira desta
nação tinha cachorros (os leões) e entenderam que o Rei de Portugal havia feito
venda deles como escravos para irem para a América. Alguns homens da Ilha de
Ano Bom disseram-me que a fuga para o mato foi depois que viram prender um
homem chamado Pedro Martins, mas outros me informaram que esta prisão tivera
lugar dentro de uma casa em que ele se ocultara na ocasião da fuga do povo para
o mato. A tropa que desembarcou e os navios fizeram algum fogo contra a terra.
Este acontecimento acabou de
desacorçoar 4 os espanhóis e como eles já então haviam perdido o Conde de
Argelar o Ministro da Fazenda Real e 300 marinheiros e soldados, tendo os
portugueses também perdido acima de 150 homens, houve uma sedição a bordo dos navios
espanhóis dirigida por um sargento de artilharia e os sediciosos obrigaram ao
Tenente Coronel D. Joaquim Primo de Rivera sucessor do Conde Governador, e ao
Capitão do navio D. José Varela a regressar a S. Tomé donde fizeram (viagem?)
para o Rio da Prata. Assim acabou a expedição da colonização espanhola das
ilhas de Ano Bom e Fernando Pó, em prejuízo de ambas as monarquias que entraram
no contrato. O aviso expedido a Luís Caetano de Castro para expedição das ilhas
foi datado de 19 de Fevereiro de 1779 e o abandono pelos espanhóis foi em 1780.
Estes disseram que largaram a colónia e recolheram-se a Rio da Prata por
temerem serem aprisionados pelos ingleses com que (m) então começavam a ter
guerra.
No ano de 1810 aportou à ilha de Ano
Bom um bergantim da Bahia que regressava da Costa da Mina e pretendia tomar aí
alguns mantimentos para os escravos de que se achava carregado. O Capitão-mor
da ilha foi logo a bordo na forma do costume para receber os presentes ou
pagamento da licença de negociar e com ele foram mais cinquenta pessoas pela
maior parte homens e rapazes; como ventava muito o bergantim garrou, fez-se à
vela e apesar de todas as diligências não pôde tomar o porto e viu-se obrigado
a conduzir aqueles homens à Ilha de S. Tomé. O Governador Luís Joaquim Lisboa
recebeu e arbitrou uma pequena mesada para sustentação do Capitão-mor e a outra
gente agregou-se aos seus numerosos patrícios que por motivos semelhantes ou
ainda piores vivem e sustentam-se pela pescaria na ilha de S. Tomé. O
Governador deu parte destes acontecimentos ao Ministério do Rio de Janeiro, o
qual em conformidade da opinião do mesmo Governador ordenou que o Capitão Mor e
habitantes de Ano Bom fossem conduzidos à sua terra, que fossem acompanhados
por um eclesiástico, que se conhecesse o modo de pensar da população acerca do
Governo português e que depois do seu desembarque fosse o navio examinar as
paragens em que se diz existir ou haver existido a ilha de S. Mateus. O
Governador mandou logo aprontar a escuna artilheira comandada por José Joaquim
Veloso, primeiro piloto da Armada Real e pediu que se nomeasse o Padre Simão de
Sousa e Oliveira para ir como missionário. Este eclesiástico homem preto muito
honesto e o mais próprio que na ilha existia para tal missão, não duvidou
sujeitar-se aos riscos que acompanham aos clérigos brancos ou pretos que se
estabelecem na ilha de Ano Bom cujos habitantes só respeitam os Barbadinhos
Italianos, talvez por serem mais circunspectos acerca das mulheres, por terem
barbas compridas e por falarem uma linguagem diferente da portuguesa. A escuna
saiu para a ilha de Ano Bom no fim do ano de 1811 com toda a esperança de
encontrar acolhimento, porque poucos dias antes de se fazer de vela aportou a
S. Tomé uma canoa com seis homens da outra ilha os quais com outros 54
indivíduos de ambos os sexos e idades foram expostos às ondas em pequenas
canoas por um fanático chamado André que os acusou de crime de feitiçaria e de
serem causadores do desaparecimento do capitão Mor e dos 50 homens que agora
estavam para regressar à sua terra. A exposição às ondas em pequenas canoas com
uma cabaça cheia de água, alguma farinha e peixe é o castigo que se dá aos
indigitados como feiticeiros na Ilha de Ano Bom; a corrente da água e o vento
do sul para o norte conduziu algumas vezes até à ilha de S. Tomé, a qual se
avista de mais de 30 léguas (150 km?) de distância, acontecendo porém não
descobrirem a ilha por estar coberta de nevoeiros perecem infalivelmente como
aconteceu aos 54 lançados ao mar pelo André. Quase todos os homens e mulheres
da ilha de Ano Bom que existem em S. Tomé foram expostos às ondas como
feiticeiros. Basta uma voz que acuse a qualquer pessoa de feiticeira para
insensivelmente ser lançada ao mar.
A escuna artilheira teve uma viagem
feliz até à ilha de Ano Bom, os ilhéus vieram logo a bordo encontrando o
Capitão-mor e os seus patrícios, que reputavam perdidos; foram dar parte ao
fanático André que estava governando a terra desde que desaparecera o
capitão-mor. O André mandou logo proibir as comunicações da gente da ilha com
os do navio e muito de longe fez dizer ao Comandante que - Deus lhe tinha dito
que não recebesse o capitão Mor e os seus patrícios porque tinham aprendido
feitiçaria em S. Tomé e que também não recebesse o padre, porque ele só queria
Barbadinhos e não Clérigos Pretos. Nestas circunstâncias o Comandante regressou
com os passageiros à ilha donde tinha saído, ficando assim frustrada não só
esta comissão, como também a de indagar da existência e qualidades da ilha de
S. Mateus. O mencionado André fez-se aclamar Rei da Ilha de Ano Bom no ano de
1814 e tomou como insígnias reais as vestimentas de celebrar missa.
Cunha Mattos contactou com o
Capitão-mor em 1815 e obteve conhecimentos sobre a ilha que se transcrevem:
Na ilha há duas povoações principais e
três aldeias. A Povoação principal recebe o nome de - Cidade da Praia - tem
coisa de 300 braças de comprimento (cerca de 600 metros) e 100 de largura
(cerca de 200 metros); mais de 400 barracas ou choupanas cobertas de folhas de
palmeiras e 5 igrejas. Perto da cidade corre um ribeiro chamado - Água Pata - o
qual nasce em uma pequena lagoa que existe nas abas do Pico da Mãe Serafina; e
não no cume como dizem alguns geógrafos. As igrejas da cidade são:
- 1º N. Sª. da Conceição, a que chamam
Sé, construída de madeira como são todos os quatro edifícios da ilha, e nela
existem várias peças de prata antigas e uma píxide, cálice e vários ornamentos
novos bem conservados. Há a matriz da ilha. O Padre Fr. Agostinho de S. Maria,
no Tomo 10 do Santuário mariano falando da ilha de Ano Bom informa que
antigamente tivera duas paróquias dedicadas a S. João e S. Pedro; por
conseguinte a velha Cidade da Praia e a Paróquia de N. Sª: da Conceição ainda
não existia nesse tempo, o que me parece improvável.
- A segunda igreja da cidade é a da
Misericórdia junto da qual existia um belo e pequeno Hospício dos Capuchinhos
Italianos, e aí conservavam as imagens de Santo Agostinho colocado pelos
Missionários Eremitas Descalços quando lá estiveram e a de Santa Isabel.
- A 3ª igreja é a de S. José;
- a 4ª é a de S. António. De todas
estas dá notícia o autor do sobredito Santuário Mariano;
- Mas falta-lhe a 5ª que é dedicada a
Santa Ana e por isso é de construção mais moderna. As três últimas igrejas são
muito pobres.
A Povoação de S. Pedro fica ao sul da
praia; é pequena e está assentada junto à ribeira denominada Água Grande. Pelo
que diz o autor de Santuário Mariano, foi paroquial no tempo antigo; Cunha
Mattos não acreditou por não ver a côngrua designada nas Folhas Eclesiásticas
antigos e modernas; só encontrou uma disposição e a Provisão de 4 de Março de
1755 determinando que ao Vigário Missionário se abonassem na Bahia 200$000 réis
de côngrua anual. A igreja desta povoação é dedicada ao Apóstolo S. Pedro e
apenas tem os indispensáveis ornamentos para se dizer a missa.
As aldeias da ilha são: 1ª a de N. Sª.
das Neves, 2ª Santa Cruz e 3ª São João. Esta última é a que o autor do
Santuário diz ter sido antigamente paroquial, o que não se acredita salvo se se
reputar como paroquial por haver ali existido algum missionário. Estas aldeias
são mui pequenas e os seus habitantes vivem da pesca e de uma agricultura mui
acanhada.
Além dos ribeirões já indicados com os
nomes de Água Pata e Água Grande, existem muitos outros, o mais célebre deles é
chamado Água Bobo ou Água Amarela da qual só os missionários podiam fazer uso
por ser reputada de água sagrada.
Esta ilha que apenas tem 6 léguas de
circunferência (30 km), é composta de altíssimas montanhas, a mais elevada das
quais é o Pico da Mãe Serafina que se pode descobrir da distância de 20 léguas
(100 km), por ter 3000 pés de altura (900 m). A direcção destas montanhas
formam nas costas as duas únicas enseadas da cidade e de S. Pedro, esta entre
as Pontas do Ilhéu Grande e do Palmito, e aquela entre a Ponta do Palmito e a
Grossa, que compreendem a Praia Grande e Pequena. As outras costas da ilha
estão cheias de recifes ou são inabordáveis por causa das rochas em que batem o
mar. O porto da Praia tem 18 braças de fundo e vai diminuindo até 4 sem risco
nenhum.
A leste da Ponta do Palmito ficam os
Ilhéus Grande e Pequeno. Na ponta do Norte fica perto da ilha o Ilhéu Batel. A
oes-noroeste há três ilhéus que parecem pirâmides ou navios á vela e são o
Ilhéu Mumo, o Castelo e o Ubua. Na costa do sul entre a Água Bobo e um ribeirão
chamado Rio Grande ficam três ilhotas chamadas Três Irmãos. É isto o que mostra
a planta da ilha copiada do original feita pelo Capitão Tenente Francisco
Montaseaur e está anexa às instruções dadas pelo Ministro da Marinha Martinho
de Melo e Castro ao Capitão de Mar e Guerra Luís Caetano de Castro em 19 de
Fevereiro de 1778.
A agricultura da ilha é muito pequena
mas chega para os habitantes e ainda para os estranhos sobretudo no que
respeita a frutas e raízes de crescimento espontâneo. Há poucos cultivadores de
milho, mandioca e outros géneros leguminosos e farináceos. Muitas galinhas,
patos, carneiros, cabras e porcos. Nenhuns bois nem cavalos. Não existem
animais venenosos nem feras e á inúmeros cães e gatos. Encontram-se madeiras de
boa qualidade e uma delas é semelhante ao pinho da Europa. O peixe é imenso e
quase a única comida dos habitantes.
Antigamente teciam-se muitos e belos
panos de algodão semelhantes aos de S. Tomé e Príncipe e ainda hoje se tecem
mas em menor quantidade. Existem alguns maus carpinteiros e ainda menor número
de péssimos ferreiros; há vários oleiros e alfaiates e dois outros remendões
que se chamam sapateiros. Os navios que ali tomam mantimentos, vendem ou trocam
aquilo que é necessário para uso do povo.
A linguagem dos habitantes da Ilha de
Ano Bom é (era) a portuguesa corrompida pela pronunciação e pelo ajuntamento de
muitos termos dos idiomas africanos. Quando falam parecem-se com os pescadores
algarvios mais cerrados e arremedam menos aos habitantes de S. Tomé do que aos
da Ilha do Príncipe. A sua religião é a católica romana de mistura com os
abusos e superstições inumeráveis.
Todos trazem grossas contas e cruzes
ao pescoço, sabem infinitas orações que recitam em voz alta pela manhã e à
noite. São os mais cobardes de todos os homens, nunca se servem de facas contra
os seus patrícios, as suas desordens acabam por uma gritaria insuportável e
quando chegam a vias de facto acometem-se às punhadas por um modo único no
universo, põe-se um contendor defronte do outro e depois aquele que reputa ter
maior razão diz ao antagonista - cópá dámi, prá mi dá cópá! - Compadre dá-me
para eu dar no compadre - e assim aos murros alternados se desempoeiram até
haver quem os aparte. O procedimento de exporem às ondas as pessoas indigitadas
de feiticeiras, prova a sua cobardia e o seu fanatismo religioso., pois não se
atrevem a derramar sangue. Quase todos são bêbados preguiçosos, insignes
nadadores e limpos na roupa velha de que se cobrem. Nos domingos e dias santos
ajuntam-se em família, assentam fora das portas das suas choupanas e começam
logo a beber enormes quantidades de vinho de palmeira.
Terminado o banquete, o licor
principia a perturbar-lhes os sentidos começam uma cantilena em voz baixa e
monótona a qual se vai levantando pouco a pouco como quem chora e assim
prosseguem até fazerem uma insuportável berraria em que se lembram da sua terra
e dos seus amigos e parentes, até que de todo perdem a razão. Neste estado
muitos dão murros na cara e corpo, espojam-se, batem com as cabeças nas paredes
e fazem outros desatinos próprios de homens alienados do juízo. Para eles a
ilha de Ano Bom a que chamam Anibô é o Paraíso terreal, tal é o amor que os
existentes na ilha de S. Tomé conservam àquela pátria donde quase todos foram
expulsos e expostos às ondas como feiticeiros. São ladrões sagazes mas com
pouco se contentam porque é tão grande a sua inércia que nem sabem fazer ideia
da abundância como acontece a outros povos selvagens. Não trabalham sem serem
obrigados pela fome e no dia de hoje não se lembram do (dia) imediato. Dizem
que as mulheres são virtuosas ou recatadas sem constrangimento. Os baptizados e
os casamentos fazem-se nas ocasiões de aportar na ilha algum navio que leva
capelão. Vários franceses intitulando-se capelães têm ali casado e baptizado os
pobres pretos para encherem os navios de mantimentos. O sacristão da igreja de
Ano Bom ajunta o povo no templo nos domingos e dias santos e em lugar da missa
repete várias orações análogas que sabe de cor. Há alguns papéis escritos, para
este sacristão ler, em letra redonda a qual é mais bem feita do que se podia
esperar. A linguagem em que estão escritos é a do dialecto da ilha. O sacristão
é quem publica na igreja os dias santos, de jejum, têmporas e festas mudáveis e
por isso depois o Capitão-mor é a personagem mais importante do país e recebe
certos estipêndios nas ocasiões de casamentos, baptismos e funerais.
O Governo de Ano Bom é puramente
militar, procedido do antigo costume dos Donatários e Capitães-mores
portugueses, os quais deixaram de existir antes do ano de 1744. Logo que
deixaram de ir à ilha os Capitães-mores ou Tenentes dos Donatários que ali lhe
administravam as suas fazendas, teve princípio a eleição do Capitão-mor natural
do país, esta eleição era feita pelos Oficiais do Conselho e aprovado pelo
povo, quando porém existiam missionários, influíam estes nas eleições que em
tal caso recaíam nos que eram reputados mais devotos dos religiosos. O tempo de
Governo era de 3 anos, mas depois alterou-se esta ordem e o Capitão-mor governa
durante o tempo em que vão à ilha 3 navios que lhe paguem ancoragem. Por este
modo alguns capitães-mores governam um ano, outros mais, outros menos para que
os interesses cheguem a maior número de pessoas. O Capitão-mor tem o uniforme e
o bastão do estado, é uma casaca de pano vermelho grosso com galões falsos
amarelos, chapéu ornado com galão, sapatos, espada e bastão dourado. Quando é
eleito recebe estas regalias ou jóias do poder e faz entrega delas ao seu
sucessor imediato. Os Capitães-mores logo que saem do lugar, ficam membros do
Conselho, são ouvidos pelos actuais e podem ser reeleitos. Nas aldeias há
juízes e comandantes para administrarem a justiça ou decidirem as pequenas
questões dos vizinhos, e deles se apela para o Capitão-mor. Todos os homens são
soldados e fazem guardas quando o Capitão-mor julgar necessário, as mulheres
solteiras são sujeitas aos serviços públicos como em S. Tomé e Príncipe, enfim
os costumes são quase semelhantes. Os moradores da Ilha de Ano Bom sabem
perfeitamente que são escravos descendentes dos do Donatário e por isso mesmo
temem que o Rei de Portugal queira chamá-los à escravidão, tal é o motivo de
não consentirem que ali existam outras pessoas de fora da terra além dos
missionários quando os há. O Capitão-mor reputa como soldo as ancoragens que
recebe dos navios. Os juízes e comandantes têm direito a pequenos serviços, os
missionários e sacristães ao pé do altar. Não havendo tributos, não há
contabilidade e como não há processos escritos, não existem escrivães, nem
tabeliães, mas há um meirinho para citarem e prenderem os refractários. As
posses dos terrenos são conhecidas pelas balizas e a tradição serve de
escritura pública. Antigamente havia uma fortaleza no monte contíguo à povoação
chamada Cidade da Praia. Os holandeses destruíram-na e é aí que ainda em 1813
se arvorava a bandeira portuguesa antiga com a Cruz de Cristo. (nesta data não
era a ilha já espanhola?).
Ignora-se absolutamente o número dos
habitantes da ilha de Ano Bom, mas pelo que me disse o Capitão -mor é provável
que não excedam a duas mil almas ou ainda um menor número pois que ele contava
352 famílias tanto nas povoações como espalhados pelas roças. Eu não posso
afiançar o cálculo do Capitão-mor pois que era um homem extremamente ignorante,
ainda que entre os seus passava por um político (Grande Gente) abalizado. Bem
se sabe que um selvagem pode ser o primeiro em conhecimento na sua nação e
contar-se como o último em outro povo mais civilizado. Dizem que antigamente
existiram famílias brancas na ilha, mas no ano de 1814 restavam só 4 mulheres
pardas, talvez filhas dos estrangeiros que ali aportaram. Eu penso que estas
famílias brancas eram pessoas pobres pois que não restam monumentos que atestem
uma mediana opulência dos antigos moradores e é mui provável que os donatários
tivessem poucos engenhos de açúcar. O autor do Santuário Mariano impresso no
ano de 1722 diz que nesta ilha existiam mais de 700 homens e que as mulheres,
meninas e mulatas seriam algumas duas mil. A diminuição que tem havido nos
moradores talvez proceda do bárbaro e frequente costume de lançarem ao mar ou
expatriarem os indivíduos acusados de serem feiticeiros. O clima da ilha é mui
benigno e saudável por se achar longe da terra firme, gozar de ventos frescos e
ser refrigerada pelos vapores das águas do oceano mais puras do que as que
banham as costas do Golfo do Benim, que recebem as matérias pútridas arrojadas
pelos inumeráveis e caudalosos rios existentes desde o Cabo das Duas Pontas até
ao de Santa Catarina. Eu penso que os efeitos do Hermatan ou Vento Norte que é
no Golfo do Benim e em outros lugares da Costa da África não alcançam a ilha de
Ano Bom. Um escritor Mr. Bother diz que há 3000 habitantes.
Eis aqui o que Cunha Mattos conseguiu
saber a respeito desta ilha cujos habitantes reputando-se livres, são os mais
desgraçados homens do universo, tanto pelo abandono em que se acham, como pelo
fanatismo religioso, que barbaramente os vai extinguindo. O mesmo Mattos
pensava que esta ilha seria um excelente lugar para estabelecer muitos milhares
de africanos livres de que o Brasil precisava de ser expurgado (Espanha
pretendeu fazer isto levando de Cuba para Fernando Pó os libertos que lá havia
em excesso) tanto por ser mui salubre, como ter grandes proporções para uma
cultura.
Ano Bom
É uma pequena ilha pertencendo
actualmente à Guiné Equatorial, localizada a sudoeste e a cerca de 180 km de S.
Tomé. Tem de comprimento máximo 6,4 km e de largura 3,2 km., sendo a sua área
de 17,5 km2. Tem de população cerca de 5.000 habitantes e como capital S.
António da Praia.
Pensa-se que a ilha foi descoberta por
exploradores portugueses sob o comando de Fernão Pó, a caminho da Índia em
1473, tendo sido povoada com angolas em 1474.
Em 1778 foi dada a Espanha juntamente
com a Ilha de Fernão Pó (actual Bioko) e toda a costa da Guiné em troca dos
territórios espanhóis junto ao Brasil. Fez parte da Guiné Espanhola desde essa
data, com a Ilha de Fernão Pó, as ilhas de Corisco, Elobey Grande e Elobey
Pequeno, junto à costa da Guiné Equatorial.
Em 1968 a Guiné Espanhola emancipou-se
de Espanha, formando o estado da Guiné Equatorial.
Actualmente tem o nome de Pigalu ou
Pagalu que quer dizer papagaio em português. Devido à distancia de Bata,
capital da Guiné Equatorial, e à proximidade de S. Tomé é natural que mantenha
os laços culturais com Portugal O idioma é o espanhol mas o mais usado é o
Fá-d’Ambô derivado do português e do crioulo antigo. Na data presente em Ano
Bom ou Annobon, não há água corrente, electricidade, televisores,
refrigeradores, hotéis, nem transportes regulares. O alimento básico é o peixe
com arroz importado. Há muita fruta tropical.
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