O êxito dos Descobrimentos deve-se, em grande parte, a esta embarcação
– A Caravela -
As primeiras explorações africanas (até 1436)
foram realizadas em pequenos navios denominados, barca ou barinel,
de velas quadrangulares (pano redondo)
Porém, com o alargamento das viagens para o Sul
do Bojador, as dificuldades de regresso contra os ventos alísios de NE,
reconheceu-se a necessidade de adoptar um tipo de navio mais apropriado – a
caravela, de dois ou três mastros, todos com velas triângulares (velame
latino) o que facilitou a navegação com ventos desfavoráveis.
A navegação ao longo da costa ocidental africana
para Sul do cabo Bojador, com baías, enseadas e rios a explorar, cabos a
dobrar, rochas e baixios a evitar, exigiu outro tipo de navio – mais
manobrável, com pouco calado e mais robusto, armar remos e navegar com
ventos fracos, que suportasse os ventos fortes do alto mar, mais rápido a
fugir dos perigos e regressar a Portugal em pouco tempo
A caravela foi o tipo de navio construído, o êxito dos Descobrimentos
deveu-se, em grande parte, a esta embarcação.
Depois da viagem de Bartolomeu Dias, os longos
percursos veêm mostrar que as caravelas não tinham suficiente robustez para
vencer os mares procelosos, por isso, com a expedição de Vasco da Gama,
começaram a construir-se “ navios mais fortes” com velame redondo, denominados naus.
À popa e à proa das naus, alteavam-se castelos,
para abrigo da tripulação e das guarnições militares.
Foi em caravelas que a técnica de navegar no
Atlântico começou a ser desenvolvida, lenta e empiricamente pelos marinheiros
de Sagres, de Lagos e de Lisboa.
O aperfeiçoamento da navegação astronómica irá
dar à Europa a hegemonia sobre o mundo durante vários séculos.
Foi em caravelas que os Portugueses estudaram o
regime dos ventos e correntes do Atlântico, que veio permitir aos navios à vela
escolherem as rotas apropriadas, que ainda hoje são seguidas.
Foi devido às caravelas que o ouro do Alto
Senegal e do Níger, em vez de seguir em caravanas para Norte de África, passou
a ser desviado para a costa, embarcado nos navios portugueses e transformado em
moedas de ouro, na casa da Moeda de Lisboa.
Foi em caravelas que os Portugueses passaram do
Atlântico ao Índico e procederam ao levantamento das costas, com que os
cartógrafos traçaram as cartas e planisférios, que ainda hoje causam a
admiração do mundo, pela exacta perfeição com que foram elaborados.
Foi com os diversos tipos de caravelas que os
construtores navais portugueses conseguiram atingir um nível técnico, que as
outras nações civilizadas invejavam.
A vida a bordo das caravelas dos descobrimentos
era extremamente dura.
As tripulações, mal abrigadas do tempo, dormiam
quase sempre no convés.
Só os principais dispõem de um pequeno cubículo
no castelo da popa, dormia-se vestido e andava-se descalço.
A navegação em costas desconhecidas fez-se de
dia e sempre com grandes cautelas. O batel foi usado com frequência para
indicar o caminho e, por vezes, recorre-se aos remos da própria caravela.
As grandes velas latinas, em vergas que excediam
o comprimento do navio, requeriam uma atenção constante, eram de difícil
manobra com ventos fortes e, quando molhadas, eram muito pesadas.
Com intervalos de alguns meses, a caravela tinha
de ser carenada numa praia. A madeira do forro do casco era limpa dos limos que
reduziam a velocidade e era protegida contra o teredo, molusco que perfuravam
as madeiras imersas, muito activo em águas quentes.
O calafeto também era reparado e beneficiavam-se
o massame, as velas e a mastreação.
No convés, que por ser de madeira tinha de ser
molhado diariamente para se manter estanque, além do batel, dos remos, vergas e
sobressalentes e alguns abastecimentos, muitas vezes havia galinhas e outros
animais vivos para consumo durante a viagem, tudo isto bem amarrado e em locais
que não estorvavam a manobra.
Quando as caravelas eram utilizadas no comércio,
a carga era arrumada no convés e no porão.
Por baixo do convés, além do lastro de pedras,
guardavam-se os barris com água e vinho, os abastecimentos, velas, cabos e
outros sobressalentes.
A água das infiltrações do forro e do convés
acumulava-se no fundo e tinha de ser esgotada, apesar de ajudar a manter o
calafeto. Os barris, mesmo os melhores construídos, com os balanços acabavam
por derramar.
Os mantimentos embarcados em Portugal, à base de
pão, biscoitos, carne salgada e peixe seco, azeite, mel e frutos secos,
depressa se estragavam, no ambiente quente e húmido. E os roedores sempre
presentes eram hóspedes indesejáveis a bordo dos navios de todos os tempos.
A água doce, em barris de madeira, era um bem
precioso que se tinha de poupar e racionar. Após algumas semanas, sobretudo em
climas quentes, inquina, constituindo com frequência o impedimento à
continuação das viagens.
Quando o tempo permitia, cozinhava-se uma
refeição quente no convés, num local abrigado do vento. O lume era de carvão ou
lenha e ardia sobre terra ou areia.
A pesca, mesmo a navegar, era uma ocupação
frequente e de raras distracções.
Logo que se chegava a terra procura-se água,
alimentos frescos e lenha.
O frio, o calor e a humidade eram
suportados sem equipamento nem vestuário mais convenientes.
As doenças causadas pela má alimentação e as
doenças tropicais eram rudimentarmente tratadas.
A bordo não se podia adoecer. Os ferimentos com
veneno eram lavados e untados com triaga, que era então uma espécie de panaceia
para todas as feridas.
Sem comunicação com o exterior e sem apoios em
terra, as tripulações estavam entregues a si próprias e à protecção divina, durante
meses e até anos, sempre na dependência do vento.
Foram muitos os que não regressavam, mas a maioria dos que voltavam,
tornava novamente a partir. [António Cardoso]
A vida a bordo
O Mar na época dos Descobrimentos
As viagens marítimas eram de grande risco.
De facto, as estatísticas desta época eram
terríveis para quem procurava a aventura saindo de Portugal.
Em média menos de metade regressavam.
As
causas da sua morte eram várias, desde os naufrágios por causas climatéricas e
dificuldades marítimas, passando por causas bélicas.
Não raras vezes os homens
que saiam de Portugal em busca de ganhar a sua fortuna acabavam por participar
em guerras como mercenários muito bem pagos perecendo não raras vezes nos
campos de batalha.
Será necessário não esquecer ainda o contacto com doenças
tropicais para as quais os europeus e a sua medicina primitiva não estavam de
todo preparados.
Por fim, um pequeno número prosperava e muitas vezes não
regressava ao país natal.
A frequência dos naufrágios seriam com certeza traumatizantes, sendo que o maior
poeta deste período chegou a sofrer um e descreveu no canto X do seu poema Os
Lusíadas:
“Vêm do naufrágio triste e miserando,
Dos procelosos baixos escapados,
Das fomes, dos perigos grandes, quando
Será o injusto mando executado”
Fernão
Mendes Pinto na sua narração descreve vários episódios de naufrágios dos quais
conseguiu sobreviver miraculosamente, também é um bom exemplo deste constante
perigo.
O duro quotidiano a bordo dos navios
dos Descobrimentos era afectado por um conjunto de factores, naturais e
humanos, que o transformavam num raro exemplo das continuadas dificuldades e
privações enfrentadas por aqueles que viam no mar, ou nas terras para além
dele, a promessa de riquezas ou de uma vida melhor, embarcando muitas vezes sem
consciência dos perigos e das provações que os aguardavam, “que o não pode
contar senão quem o passa”.
Sucedendo às etapas de navegação
relativamente curtas que uniam o continente às ilhas atlânticas ou que haviam
proporcionado o reconhecimento sistemático da costa ocidental africana, a
permanência no alto mar alargou-se definitivamente no tempo e no espaço com o
estabelecimento, logo no início do século XVI, de uma ligação anual regular
entre Lisboa e o Oriente – a Carreira da Índia. De facto, nenhum outro momento
das navegações portuguesas determinou a existência de uma micro-sociedade
embarcada, sujeita a severas regras de conduta, impostas por uma hierarquia
estabelecida de molde a zelar por todas as componentes da vida no mar.
Desde logo, o conforto de tripulações
e passageiros não constituía prioridade na concepção e construção dos navios,
sendo que o aumento da respectiva tonelagem, ditado por crescentes desejos de
lucro e necessidades de defesa, em pouco contribuiu para a melhoria das
condições de vida a bordo, possibilitando, outrossim, a multiplicação do número
de almas obrigadas a conviver durante um trajecto que, em circunstâncias
favoráveis, demoraria entre seis e sete meses a percorrer, submetidas
consecutivamente à meteorologia primaveril da partida, às tórridas temperaturas
das calmarias equatoriais e ao rigor da invernia austral que anunciava a
aproximação ao Cabo da Boa Esperança. Assim, na típica nau de três cobertas e
de cerca de 500 tonéis de arqueação, viam-se usualmente confinadas mais de 500
pessoas, entre pessoal de navegação, equipagem de manobra e de manutenção,
soldados, artilheiros e grande número de vulgares passageiros, compartilhando o
exíguo espaço disponível com carga, materiais e equipamentos de reposição e até
com animais vivos. Apesar de algum esforço colocado na organização do espaço,
poucos eram os que não tinham que suportar um ambiente promíscuo, gerador de
comportamentos agressivos e depressivos.
A alimentação e a água potável
constituíam um problema recorrente. No que respeita aos mantimentos, enquanto
os passageiros deviam garantir à partida a sua própria subsistência durante a
viagem, o que raramente acontecia, tanto por ignorância como por insuficiência
de recursos, cabia ao armador o abastecimento da despensa do navio, por forma a
manter toda a tripulação. Mesmo em condições normais, os alimentos eram alvo de
distribuição racionada, efectuada numa base diária ou mensal consoante o tipo
de produto, verificando-se níveis de verdadeira penúria, impostos por
circunstâncias desfavoráveis. Ainda que se recorresse pontualmente ao abate de
animais e à pesca, a dieta a bordo centrava-se no consumo de biscoito - pão
cozido pelo menos duas vezes, aumentando o seu período de conservação -
enchidos e alimentos salgados, sobretudo carne de porco, mas também algum
peixe, acompanhados pela ração diária de vinho. Devido à cupidez dos
fornecedores oficiais, os géneros eram frequentemente de qualidade duvidosa, o
que originava a sua rápida deterioração em contacto com o calor e a humidade
tropicais.
Quanto à água, o racionamento
aumentava em austeridade ao longo da viagem, ao mesmo tempo que a qualidade
decrescia face à falta de higiene do vasilhame utilizado, o que era extensivo
ao acondicionamento do vinho. Desta forma, a sede era uma constante a bordo,
piorando a situação com a necessidade de consumo dos géneros conservados em
sal, motivando a reutilização da água usada para os demolhar e cozer, sendo
posteriormente ingerida em caso de necessidade. A escassez ou a total falta do
precioso líquido afirmava-se como a causa mais forte para a realização das
pouco frequentes escalas de reabastecimento, existindo exemplos de partidas de
Lisboa que apenas fizeram aguada por alturas de Moçambique.
Encontrava-se, assim, montado o
cenário de tantos relatos, onde abundam expressões como “água fedorenta que se
bebia a pequenos tragos, apertando o nariz”, “biscoito magro e cheio de bichos”
ou “ vinho que era vinagre muito sujo”.
As restrições quanto ao consumo de
água implicavam a existência de condições sanitárias extraordinariamente
precárias. Com a higiene pessoal reduzida à sua mínima expressão e a frequente
impossibilidade de proceder ao despejo de dejectos, a atmosfera nas áreas pouco
ventiladas situadas entre cobertas rapidamente se tornava nauseabunda, o que,
associado às circunstâncias climatéricas e à deficiente nutrição, concorria
para o aparecimento e fácil propagação de um rol alargado de enfermidades:
febres tropicais, chagas várias, pleurisias associadas ao frio austral, toda a
espécie de parasitas, tifo, sarampo, doenças venéreas e de pele relacionadas
com a ausência de higiene e, a partir da segunda metade da viagem, o temível
escorbuto, provocado por grave insuficiência vitamínica, cuja prevenção através
da ingestão de fruta apenas tardiamente se tornou conhecida e praticada.
Acantonados na coberta intermédia,
onde o ar era quase irrespirável, o crescente número de doentes chegava a
provocar a redução significativa de braços disponíveis para a manobra e a
afectar a prontidão bélica defensiva. Encontravam-se entregue às sangrias e a
outros rudimentares cuidados de saúde aplicados pelo barbeiro de bordo, o qual
substituía o cirurgião, cuja presença, ainda que regulamentar, se via
frequentemente inviabilizada por razões de ordem financeira. Era comum a
existência de uma botica, mas os remédios e mezinhas disponíveis revelavam-se
naturalmente pouco eficazes. Ainda no que toca ao amparo dos enfermos, a
presença de missionários a bordo detinha grande importância, já que os
religiosos assumiam com enorme dedicação o papel de enfermeiros, contribuindo
para amenizar um cenário geral de dependência e sofrimento.
Dada a multiplicidade de factores
envolvidos, as viagens registavam níveis de mortalidade bastante variáveis,
alternando-se perdas humanas reduzidas com ocorrências em que cerca de metade
do número de embarcados encontrava no oceano a sua última morada.
As consequências de tão longa estadia
no mar reflectiam-se igualmente no plano psicológico e emocional, ainda que de
modo diferente sobre segmentos distintos da população embarcada: para além do
comum receio em relação ao riscos representados por intempéries e ataques de
corsários, à penosa ociosidade forçada dos passageiros contrapunha-se o
esgotante labor da tripulação, contribuindo uma e outro para um ambiente de
permanente tensão a bordo.
Tratava-se, pois, de encontrar formas
de ocupar o espírito, com recurso tanto ao âmbito do profano como do religioso.
Quanto à primeira vertente, qualquer acontecimento benéfico que quebrasse a
rotina servia de pretexto para festejar. Do mesmo modo, os hábitos de terra
viam-se transpostos e adaptados à vivência a bordo, destacando-se os jogos de
azar, os quais, apesar de proibidos por degenerarem facilmente em altercações e
violência, eram tolerados enquanto uma das raras diversões existentes, apesar
da crítica dos religiosos embarcados, verdadeiros agentes da observação da
moral e bons costumes. Simulavam-se touradas, utilizando canastros empurrados
ou largando no convés os tubarões que se deixavam enlear nas redes de pesca,
existindo ainda registos da representação de peças teatrais, sobretudo de teor
sacro.
De facto, os aspectos religiosos eram
“guardados a bordo dos navios como em terra”. Organizavam-se procissões que
percorriam o navio, salientando-se aquela que marcava as festividades pascais,
realizada pouco depois da saída do Tejo. Por seu turno, quer as missas de acção
de graças realizadas após qualquer aflição, quer os ofícios regulares, detinham
audiência alargada, assumindo-se, tal como em terra, como um importante momento
de controlo social. Até ao século XVII, o ritual eucarístico revestiu-se de uma
singular particularidade, só possível mediante autorização papal: por forma a
evitar o risco de derramar o “sangue de Cristo” devido à acção da ondulação, o
vinho encontrava-se ausente da celebração, dando origem às designadas “missas
secas”.
Principal fonte de informação, são bem
claros os relatos de viagens redigidos por padres, mormente jesuítas em
trânsito de e para a Índia: para os passageiros que conseguiam suplantar os
ataques de corsários, a fome e a sede, a sobrelotação e a promiscuidade, as
moléstias do corpo e o desânimo do espírito, o clima e as tempestades, a
chegada ao destino apenas poderia significar uma enorme sensação de alívio em
relação a todas as enormes privações e riscos que a demorada permanência a
bordo determinava.
Rui Roque
Bibliografia:
DOMINGUES, Francisco Contente;
GUERREIRO, Inácio, A vida a bordo na carreira da Índia: século XVI, Lisboa,
Instituto de Investigação Científica Tropical, 1988, Separata da Revista da
Universidade de Coimbra, vol. XXXIV.
IDEM, «A evolução da Carreira da Índia
até aos inícios do século XVII»,Portugal no Mundo, vol. IV, Luís de Albuquerque
(dir.), Lisboa, Alfa, 1989, pp. 105-130.
GUERREIRO, Inácio, «Particularidades
da vida no mar», Revista Oceanos, nº. 38, Lisboa, 1999, pp. 149-157.
Fonte:
Pedro Cruz –
blogMarinha de Guerra Portuguesa
Ribeira das
Naus - XVI - XVIII
A Ribeira das Naus
Ribeira das Naus foi o nome dado a partir da construção do Paço da Ribeira
às novas tercenas que o Rei Dom Manuel I mandou edificar a ocidente do Novo Palácio
Real, construído sobre o local das tercenas medievais. O seu antigo local
faz hoje parte das Instalações da Administração Central da Marinha.
A Ribeira das Naus,
constituíram os maiores estaleiros do ‘Império Oceânico Português’, servindo de
modelo aos restantes que se foram construindo além-mar, nomeadamente às
Ribeiras de Goa e de Cochim.
Foi construído sob a supervisão do próprio Rei Dom Manuel I.
O conjunto de estabelecimentos, não eram exclusivamente navais, porque
continha armazéns de armas para o exército. Este arsenal que eram as
antigas Tercenas Navais que á alguns séculos se construíam as embarcações de
guerra e comercial teve o nome de 'Ribeira das naus', que conservou até ao
século XVIII, mais precisamente até ao terramoto de 1755.
A Ribeira das Naus foram construídas sobre o local das antigas ‘Tercenas
navais’, a construção naval estava interligado com o novo Paço Real e os
trabalhos de construção supervisionadas pelo Rei Don Manuel I, que deixava o
antigo Paço Real no Castelo de São Jorge.
O novo complexo de edifícios estavam interligados no novo conceito
manuelino, a expansão ultramarina. Dom Manuel I e a cidade de Lisboa
viram-se para o rio onde chega as riquezas do Império.
Quando o palácio dos Corte-Reais foi para a coroa e foi residência dos
príncipes herdeiros todo o complexo era constituído pelo palácio do príncipe
herdeiro, depois a ribeira das naus com todos os seus edifícios, o paço real, o
terreiro do paço e um conjunto de armazéns que acabavam na antiga muralha
fernandina.
A Ribeira das Naus passou a
ser designada 'Arsenal Real da Marinha' quando as suas instalações construídas
no mesmo local, no âmbito da reconstrução da Baixa de Lisboa depois do
terremoto. Esta denominação passou ao novo arsenal, por alvará de 16 de
Novembro de 1755, e por muito tempo ainda o povo assim lhe chamava.
Um notável exemplo de longevidade de uma nau do primeiro quartel do Século
XVI foi dado pelos nove anos de aventuras e trabalhos da célebre ‘Flor de La
Mar’, afundada nas costas de Sumatra com os tesouros de Malaca trazidos por
Afonso de Albuquerque.
Segundo o “Livro de Toda a Fazenda”, a contabilidade
pública de então, em 1505, o Rei Dom Manuel I de Portugal, encarregou o
provedor João Serrão de armar oito grandes Naus, seis Navetas e oito Caravelas,
além de outros navios, para formarem a Armada do Vice-Rei Dom Francisco de
Almeida. A ‘Flor de La Mar’, capitaneada pelo Alcaide menor de Lisboa Dom João
da Nova, fazia parte com a ‘Bom Jesus’, a ‘São Gabriel’, a ‘São João’, a
‘Espírito Santo’, a ‘São Tiago’, a ‘Bota Fogo’ e a ‘Santa Catarina’ do lote de
8 naus de 400 toneladas, cuja principal missão era estabelecer o domínio naval
português no Índico. Provavelmente tratava-se da segunda viagem à Índia da Nau
‘Flor de La Mar’ com João da nova como capitão. Efectivamente, este galego de
nação e fidalgo de Portugal fora o Capitão-Mor da terceira Armada enviada por
Dom Manuel I à Índia. Com três naus, uma delas talvez a ‘Flor de La Mar’,
apesar da crónica de Goês não citá-la ainda de nome, e uma Caravela, ‘João da
Nova’ partiu a 5 de Março de 1501 para chegar a Cananor em Agosto e receber um
primeiro carregamento completado depois em Cochim, onde as Naus foram
calafetadas, reparadas e breadas. Depois de umas escaramuças que levaram ao
afundamento de três Paraus de uma grande frota enviada pelo Samorim, Dom João
da Nova regressa a Lisboa, tendo entrado no Tejo a 11 de Setembro de 1502. Na
segunda viagem do notável navegador que parece não ter o seu nome merecidamente
glorificado numa rua de Lisboa, este recebeu ordens para cruzar entre o Cabo
Camorim e as Ilhas Maldivas, levando também um alvará real de nomeação para
Capitão-Mor da Armada da costa da Índia. A Armada de Dom Francisco de Almeida
com a ‘Flor de La Mar’ largou pois a 5 de Março de 1505, dobrou o Cabo da Boa
Esperança em fins de Junho sem grandes percalços. Nos primeiros dias de Agosto,
as principais Naus da Armada com a Capitania lançaram ferros frente a Mombaça.
O Vice-Rei mandou o intrépido João da Nova a terra para comunicar com os
habitantes.“Estes receberam-no à pedrada” (escreveu Gaspar Pereira,
escrivão da armada). João da Nova dispara dois berços de metal que levava no
batel, “com que logo na praia pagou o jogo das pedras”. “Olá
dos navios! Ide dizer ao Vice-Rei que venha em terra, que em Mombaça não há-de
achar as galinhas de Quiloa, mas vinte mil homens que lhe hão-de torcer o
focinho (…) (diziam os naturais na praia da Ilha) continuou Gaspar Correia na
sua crónica da viagem. Na manhã seguinte, 1.300 soldados da armada
desembarcaram em Mombaça, distribuídos em duas colunas. Depois de uma peleja
encarniçada, o Xeque de Mombaça pede a paz e a armada zarpou com os presentes
do potentado, agradecido por lhe pouparem a vida e não terem destruído a
cidade. A Cochim, a armada chega a 1 de Novembro, tomando de imediato
conhecimento da existência de uma esquadra de 400 navios e 10 mil homens
organizada pelo Samorim para enfrentar as forças do Vice-Rei. Muito chegado a
terra, os navios do Samorim tiveram de se haver com as caravelas e galés de
Portugal porque as naus não podiam chegar-se tanto. Numa naveta artilhada, João
da Nova comete proezas sem par juntamente com os navios mais pequenos da
armada. “Tudo era fogo, fumo e gritos” (escreve Gaspar
Correia). As três bombardas e os seis falcões de cada uma das caravelas fizeram
uma razia, opondo-se com a sua superioridade aos pelouros e flechas dos mouros.
Em Fevereiro de 1506, a ‘Flor de La Mar’ com o ‘São Gabriel’, capitaneada
por Vasco Gomes de Abreu, recebe ordens para largar de Cochim rumo a Portugal.
Além do valioso carregamento de especiarias levavam um pequeno elefante. Gaspar
Correia cita a ‘Flor de La Mar’ ainda sob o comando de João da Nova nas duas
armadas de Tristão da Cunha e Afonso de Albuquerque saídas de Lisboa para a
Índia a 5 e 7 de Abril de 1506. Na verdade, deveria estar equivocado. A ‘Flor
de La Mar’ não poderia chegar a Lisboa nessa data e outros arquivos históricos
dizem-nos que nunca chegou a sulcar novamente as águas do Tejo, pois na viagem
de regresso a Portugal arribou à Ilha de Moçambique com água aberta e grande
dificuldade para consertar a avaria. Ficou no canal entre a Ilha e a Cabaceira,
a zona de abastecimento das naus com água potável. Aí é que a armada de Tristão
da Cunha encontrou João da Nova com a sua ‘Flor de La Mar’. Sendo amigo e
compadre de João da Nova, Tristão da Cunha fez tudo para salvar a ‘Flor de La
Mar’. Comprou uma Nau comercial de Lagos que vinha na sua Armada para
transbordar toda a mercadoria que vinha na ‘Flor de La Mar’, a fim de a “pôr
a monte” para os consertos necessários. Assim feito, João da Nova e a
sua Nau foram mandados de novo para a Índia integrados na Armada de Afonso de
Albuquerque, mas João da Nova foi desgostoso por o Vice-Rei não ter aceitado o
seu alvará de Capitão-Mor e, agora, em vez do regresso à Pátria ia acompanhar
Albuquerque em trabalhos e aventuras ainda inimagináveis. Tal como a sua Nau,
também João da Nova nunca mais veria as águas do Tejo. Apesar de insatisfeito,
o Alcaide menor de Lisboa mostrou-se tremendamente eficaz em todas as tarefas
em que se meteu. Logo em Abril de 1507, João da Nova acompanha Afonso de
Albuquerque com 300 homens no ataque à fortaleza de Socotorá, defendida por
centena e meia de “fartaquins”, pondo-os todos em fuga. Reconstruiu-se
a fortaleza; Portugal controlava agora a estratégica entrada para o Mar
Vermelho. Em carta não datada, mas provavelmente de 1506, dirigida a Dom
Francisco de Almeida, Dom Manuel I ordena o envio de navios a Malaca e nomeia
João da Nova capitão-mor de uma Armada de uma Nau, um Navio e uma Caravela que
ficará aí. Ao mesmo tempo, El-Rei ordenou que a ‘Flor de La Mar’ regresse a
Portugal sob o comando de Dom Francisco de Távora, enquanto João da Nova
deveria ser o capitão da nau ‘Rei Grande’, anteriormente de Dom Távora. Não
foram cumpridas estas ordens de Dom Manuel I, era demasiado cedo para ir a
Malaca sem ter previamente estabelecido o domínio do Índico.
A Barca
A Barca
A Barca era um navio pequeno de madeira, com uma só coberta e um só mastro,
que podia levar ou não cesto de gávea. A vela era quadrada e abria-se suspensa
numa verga colocada sobre o mastro. Esta vela quadrada chama-se também vela
redonda porque enfunava com o vento e ficava arredondada como um balão. A barca
destinava-se a viagens pequenas. Foi numa barca que Gil Eanes dobrou o Cabo
Bojador em 1434.
O Caravelão
O caravelão não tinha mais de 40 ou 50 tonéis, segundo o Livro Náutico,
onde aparece a menção de "Hum caravelão pª recados".
Devia ser em tudo semelhante à caravela, arvorando dois mastros, geralmente, e
neste caso particular, a fonte citada indica que iria artilhado com dois
falcões e quatro berços (ambas peças de artilharia de pequeno calibre), com uma
tripulação de 25 pessoas. Cumpria as tarefas auxiliares nas armadas de aguadas,
abastecimentos, explorações e navio-correio. A necessidade de marcar
terminologicamente uma embarcação com estas características indica que tal só
teria acontecido uma vez vulgarizada a Caravela Redonda ou de armada (Séc. XVI)
e daí que por este termo se tivesse passado a designar uma embarcação que
poderia ser semelhante à caravela quatrocentista, embora de construção mais
tosca e agora recuperada com outras funções, no quadro naval dos Séculos XVI e
XVII.
A Carraca
Carraca (do árabe Harraqa) era o nome dado a um tipo de navio utilizado no
transporte de mercadorias referenciado em documentos dos séculos XV e XVI,
criado pelos Portugueses especificamente para as viagens oceânicas nas quais as
embarcações até então usadas no Mediterrâneo se mostravam incapazes. As
carracas eram navios de velas redondas e borda alta, e possuíam três mastros.
Os primeiros exemplares tinham uma capacidade de 200 a 600 toneladas, mas na
época em que os portugueses as utilizaram na carreira da Índia atingiu valores
de 2.000 toneladas.
O Galeão
Um galeão é um navio que se distingue dos restantes navios do mesmo tipo
pelo facto de possuir quatro mastros, de alto bordo, armado em guerra,
frequentemente utilizado no transporte de cargas que possuíam alto valor na
navegação oceânica entre os séculos XVI e XVIII. Alguns tinham 1.200 toneladas
e 40 bocas-de-fogo. O número de velas era variável e tinham duas ou três
cobertas. Uma das suas características é a existência do chamado ‘castelo’, à
sua popa, apresentando até à proa uma pequena curva. Por volta do século XII, o
galeão era uma pequena galé com uma só ordem de remos, e de formas finas. Mais
tarde aplicou-se o termo a navios de alto bordo e de velas nas carreiras da
América, da África e das Índias. Em 1770, durante a Guerra da Sucessão da
Espanha, vários galeões carregados de ouro afundaram na baía de Vigo. O galeão
além de servir às diversas Marinhas, também era usado por Piratas. Mas o normal
era, ao ser construído pelos mesmos, adquirirem uma ‘Carta de Corso’, se
transformarem em Corsários incorporando-se às Marinhas e lutando contra os
Piratas, que eram muitos.
Santiago
Em abril de 1602, o Galeão português foi capturado por dois navios
holandeses ao largo da ilha de Santa Helena, no Atlântico Sul. Na altura da
captura do Galeão este, viajava para Portugal, vindo da Índia, e, na escala em
Santa Helena, então era já habitual na jornada Índia-Portugal, fora
surpreendido pelos holandeses, que também voltavam da Ásia, mais precisamente
do sultanato de Achém, em Samatra.
São Paulo
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