Angola
– Antiga e a várias velocidades
Angola é antiga e funciona a várias
velocidades. Há quem o ignore….
a costa ocidental de
África (mapa do início do século XVII).
Angola é antiga
A cidade do Congo, M'Banza Congo, que já era capital do Reino do Congo quando a guarnição
de Diogo Cão chegou à foz do Zaire, em Abril de 1483, aparece pela primeira vez
com o nome de São Salvador do Congo
em cartas enviadas a João III de Portugal (que reinou de 1521 a 1557) por
Álvaro I do Congo (que reinou de 1568 a 1587).
Em 1549 foi construída na cidade
do Congo uma igreja católica, que foi elevada a catedral em 1596, e que é a
mais antiga igreja das Áfricas Central e Meridional.
A cidade do Congo manteve
o nome de São Salvador do Congo até pouco depois da Independência de Angola, em
11 de Novembro de 1975.
A Vila
de São Paulo de Loanda foi fundada em 25 de Janeiro de 1576 por Paulo Dias
de Novais, neto do Bartolomeu Dias que em 1488 dobrou o Cabo das Tormentas,
depois Cabo da Boa Esperança, passando do Oceano Atlântico ao Oceano Índico e
assim abrindo o Caminho Marítimo para a Índia.
Em 1578 foi fundada Benguela, depois chamada Benguela-a-Velha
e finalmente Porto Amboim, nome que
actualmente mantém.
Em 1605, com o aumento da população e do
número de edificações, que se estendiam já do Forte de São Miguel ao Convento
de São José (sito no local onde hoje se ergue o Hospital Velho, ou Hospital
Josina Machel), a Vila de São Paulo de Luanda recebeu foral de cidade, tendo
sido constituída a sua primeira vereação municipal.
A cidade de São Filipe de Benguela, capital
do chamado “Reino de Benguela”, foi fundada em 17 de Maio de 1617 por Manuel
Cerveira Pereira, Governador e Capitão-General de Angola de 1603 a 1606, num
primeiro mandato, e de 1615 a 1617, num segundo mandato. Os Reinos de Angola e
de Benguela foram autonomamente administrados de 1617 a 1869.
A partir de 1627 a cidade de Loanda tornou-se
o centro administrativo de uma região, chamada de “Reino de Angola” que
abarcava basicamente os vales dos rios Dande, Bengo e Quanza, bem como os vales
dos seus afluentes, sendo pois menor do que a região actualmente designada por
esse mesmo nome.
os Reinos do Congo, de
Angola e de Benguela (mapa do fim do século XVII).
Neste período foram erguidas:
Em 1576, a Igreja da Misericórdia;
Em 1583, a Sé Episcopal (sita no local onde
actualmente funciona a Casa Militar da Presidência da República);
Em 1593, a Igreja dos Jesuítas;
Em 1604, o Convento de São José (sito no
local onde hoje se ergue o Hospital Velho);
Em 1607, o Palácio do Governador;
Em 1623, a Casa da Câmara (sito no local onde
mais tarde funcionou o Tribunal da Relação de Luanda);
Em 1618, a Fortaleza de São Pedro da Barra;
Em 1634, a Fortaleza de São Miguel de Loanda.
fortaleza de S. Miguel de Luanda
Em 1641 Loanda foi conquistada, e saqueada,
por uma frota de 18 navios da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais sob o
comando do corsário Cornelis Corneliszoon Jol (1597 – 1641), alcunhado ‘de
Houtebeen’, ‘o Perna-de-pau’, tendo os moradores e a vereação retirado para o
Bengo, primeiro, para Massangano, depois.
Em 1648 Loanda foi reconquistada, no dia 15
de Agosto, por uma frota luso-brasileira de 12 navios, sob comando de Salvador
Correia de Sá e Benevides. Em comemoração do facto o nome da cidade foi
alterado para São Paulo da Assunção de Loanda.
De 15 de Agosto de 1648 a 10 de Novembro de
1975 a cidade de São Paulo da Assunção de Loanda permaneceu sendo a capital:
Primeiro, do Reino de Angola, um dos reinos
do Rei de Portugal.
Depois, da Província de Angola, uma colónia,
ou província ultramarina, a designação variou, da República Portuguesa.
No dia 11 de Novembro de 1975 Portugal
retirou, o Movimento Popular de Libertação de Angola, MPLA, proclamou a
independência em Luanda, a Frente Nacional para a Libertação de Angola, FNLA, e
a União Nacional para a Independência Total de Angola, UNITA, proclamaram-na em
Nova Lisboa, actual Huambo, e seguiu-se uma guerra civil que terminou em 4 de
Abril de 2002, com a vitória do MPLA.
Tendo em vista permitir avaliar a antiguidade
relativa de Angola junto algumas datas:
1483 – Contacto de Diogo Cão com a Cidade do
Congo, M’Banza Congo, que já existia.
1519 – Fundação de Havana, em Cuba.
1549 – Fundação de São Salvador da Bahia de
Todos os Santos.
1565 – Fundação de São Sebastião do Rio de
Janeiro.
1576 – Fundação de São Paulo da Assunção de
Luanda.
1617 – Fundação de São Filipe de Benguela.
1625 – Fundação de Nova Iorque.
1652 – Fundação Cidade do Cabo.
1782 – Fundação de Maputo.
1855 – Fundação de Pretória.
1880 – Fundação de Brazzaville.
1881 – Fundação de Kinshasa.
1886 – Fundação Joanesburgo.
Angola funciona a
várias velocidades
Em Angola coexistem três grandes grupos
etnolinguísticos, os Mucancalas, os Bantos e os Lusos.
crianças Mucancala.
Os Mucancalas, os mais antigos ocupantes
humanos vivos do actual território de Angola, têm a pele de diversos tons de
bege, o cabelo preto e aos montinhos encaracolados, os olhos negros e muito
frequentemente apresentam esteatopigia. São caçadores-recolectores paleolíticos
e falam uma língua da família de línguas khoisan (que se caracteriza pelo uso
de cliques como fonemas).
mulheres Banto
(Huílas).
Os Bantos, que começaram a entrar no actual
território de Angola por volta de 1300 dC, têm a pele de diversos tons de
castanho, o cabelo preto e encarapinhado, os olhos negros. São agricultores, ou
pastores, ou agricultores e pastores, bem como caçadores e guerreiros. A sua
cultura de base é característica do início da idade do ferro e falam línguas
banto (que se caracterizam pelo uso extensivo de prefixos).
Os Lusos, que começaram a entrar no actual
território de Angola por volta de 1483 dC, têm a pele, o cabelo, os olhos, de
variadas cores (o grupo inclui indivíduos de diversas ascendências). São
agricultores e criadores de gado, comerciantes, industriais, dedicando-se às
mais variadas actividades económicas dos sectores primário, secundário,
terciário e, bem assim, à administração, à cultura e à guerra. A sua cultura de
base é a moderna cultura científico-tenológica e falam português.
Três velocidades básicas portanto:
A velocidade dos Mucancalas (o Paleolítico
terá terminado na África Tropical há cerca de 5 mil anos, por volta de 3000
aC).
A velocidade dos Bantos (a Idade do Ferro
ter-se-á iniciado na África Tropical há cerca de 3 mil anos, por voltade 1000
aC).
A velocidade dos Lusos (a Idade Científico-Tecnológica
teve início há cerca 500 anos, por volta de 1500 dC, como o «... a
experiencia he madre das cousas, por ella soubemos rradicalmente a verdade...» do Esmeraldo
de Situ Orbis, p. 196).
E além das três velocidades básicas existem
as diversas velocidades intermédias, dos que têm um pé num grupo, um pé noutro
grupo…
ANEXOS:
1. Invasões
(ou migrações) e Reinos (ou impérios).
L = Lusos; A = Angola;
B = Benguela; M = Muatiânvua; B = Barotze.
Os Bantos chegaram por terra às regiões que
hoje são Angola … e desceram os rios em direcção ao mar.
Os Lusos chegaram por mar às regiões que hoje
são Angola … e subiram os rios em direcção ao interior.
Os rios descidos, ou subidos que mais importância
tiveram foram os Congo-Zaire, Dande, o Quanza e o seu afluente Lucala, o Longa,
o Cuvo-Queve, o Catumbela, o Coporolo e o Curoca. O rio Cunene não foi usado
porque, ao que parece, nos séculos XVI e XVII a água corria por baixo das dunas
que lhe ocultavam completamente a foz.
Povos e Línguas de Angola, de Carlos Pires
Mapa mostrando reinos totalmente livres da
ocupação portuguesa em 1885-1897
Angola - Mapa étnico
(1970).
O mapa supra, que usa a ortografia
anglo-saxónica embora se baseie em estudos etnográficos portugueses realizados
antes de 1975, data da independência de Angola, identifica os diversos grupos
Banto, chama aos Mucancalas Khoisan e não refere os Lusos.
Na época os Lusos (que eram e são o grupo
dominante, toda a gente em Angola falava e fala o português) encontravam-se
dispersos por todo o território e tinham concentrações importantes nas cidades
de Luanda, Nova Lisboa (Huambo), Lobito, Benguela, Sá da Bandeira (Lubango),
Moçâmedes (Namibe), Malange, Carmona (Uíge), Silva Porto (Cuíto), Luso (Luena),
Serpa Pinto (Menongue), seus arredores e corredores ferroviários e rodoviários
que as interligavam.
3. O
Nacionalismo Angolano e a Política Mundial.
1996 map of the major ethnolinguistic groups
of Africa, by the Library of Congress …
página onde se afirma que «Africans are natives or
inhabitants of Africa and people of African descent.»
Consultando a legenda, no canto inferior
esquerdo, que está organizada como segue
o Tribe or Ethnic Group Name –
nome da tribo, ou grupo etnolinguístico
o Location –
localização no mapa da tribo
o Population Estimate –
número estimado de elementos da tribo
o Variant Name (a) –
nome alternativo da tribo
constata-se que, segundo eles, em África só
existe um grupo etnolinguístico a falar uma língua indo-europeia, os
Africânderes do Cabo
o Tribe or Ethnic Group Name – Indo-European – Afrikaaner
o Location – E1
o Population Estimate –
1,788,000
o Variant Name (a) – none
e que,em Angola se falam
só línguas Banto e Khoisan. Em Moçambique só línguas Banto e em São Tomé e
Príncipe também só línguas Banto, entendimento que parece ser claramente
anómalo e carecer de explicação.
Deixando de lado a hipótese de a anomalia
decorrer da ignorância, explicação que não se reputa aceitável, parece
que a mesma decorre dos etnolinguistas norte-americanos serem, por um lado,
adeptos da superioridade racial germânica e, por outro, antipapistas (posições
que não se encontram historicamente desligadas uma da outra, bem pelo
contrário), posições ideológicas estas que os levam a considera africana a
língua dos Africânderes do Cabo, que são Frísia-Africanos, Germânicos e
Calvinistas, mas não a dos Angolanos, Moçambicanos e São-Tomenses, que são
Luso-Africanos, Latinos e Católicos.
Esta interpretação, estranha à primeira
vista, torna-se menos estranha se nos lembrarmos que a Cidade de Nova Iorque
foi fundada como Nova Amesterdão (1625), o Estado de Nova Iorque começou por
ser a Colónia dos Novos Países Baixos (1614 – 1667) da Companhia dos Novos
Países Baixos, primeiro, da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais, depois,
e que os Pilgrim Fathers, da Plymouth Colony (1620),
eram Separatistas Puritanos Brownistas Ingleses (calvinistas que consideravam
que o governo da Igreja deveria ser totalmente democrático e o ministério
evangélico um encargo a que todos deveriam ter acesso).
Isto acarreta, que no que concerne
às questões de África os Estados Unidos da América se assumem por vezes mais
como os herdeiros do Império Neerlandês do que como os herdeiros do Império
Britânico, o que acarreta que sejam hostis a Portugal e aos Luso-Africanos.
E pergunta: O que tem isto a ver
com o Nacionalismo Angolano?
Simples! Os três os Movimentos de Libertação
de Angola, FNLA, MPLA, UNITA, têm, todos três, origem nas Missões Protestante
Norte-Americanas em Angola, e foram, todos três, apoiados pelas Igrejas
Protestantes Norte-Americanas e pelo Governo do Estados Unidos da América do
Norte (embora o tenham sido em épocas diferentes).
Pequena lista de nacionalistas angolanos da
primeira geração (ordenada por data de nascimento):
António Agostinho Neto (Catete, 1922 –
Moscovo, 1979) – MPLA (Neto) – Liceu Salvador Correia, em Luanda, e
Universidades de Coimbra e de Lisboa (Medicina). Metodista.
Holden Álvaro Roberto (São Salvador do Congo,
1923 – Luanda, 2007) – FNLA – a família mudou-se para Leopoldville, no Congo
Belga, em 1925 – Liceu numa escola de uma Missão Baptista – trabalhou para o
Ministério das Finanças do Congo Belga em Leopoldville, Bukavu, e Stanleyville,
em 1951 visitou Angola e em 1954 fundou a União dos Povos do Norte de Angola
(UPNA), mais tarde União dos Povos de Angola (UPA), depois Frente Nacional de
Libertação de Angola (FNLA). Baptista.
Joaquim Pinto de Andrade (Golungo Alto, 1926
– Luanda, 2008) – MPLA (Revolta Activa) – Liceu Salvador Correia, em Luanda, e
Universidade Gregoriana de Roma (Teologia). Católico Romano.
Viriato da Cruz (Porto Amboim, 1928 – Pequim,
1973) – MPLA – Liceu Salvador Correia, em Luanda, suponho que sem estudos
universitários. Ignoro em que religião foi educado.
Mário Pinto de Andrade (Golungo Alto, 1928 –
Londres, 1990) – MPLA (Revolta Activa) – Liceu Salvador Correia, em Luanda, e
Universidade de Lisboa (Letras). Católico Romano.
Lúcio Lara (Nova Lisboa, 1929 – ainda é vivo)
– MPLA (Neto) – Liceu Diogo Cão, em Sá da Bandeira, actualmente Lubango, e
Universidades de Coimbra e de Lisboa (Ciências). Ignoro em que religião foi
educado.
Daniel Chipenda (Lobito, 1931 – Cascais,
1996) – MPLA (Revolta Leste) – Liceu Diogo Cão, em Sá da Bandeira, actualmente
Lubango, e Universidade de Coimbra (ignoro o curso), foi jogador de futebol da
Académica. Ignoro em que religião foi educado.
Jonas Malheiro Savimbi (Munhango, Moxico,
1934 – Lucusse, Moxico, 2002) – UNITA – Liceu Diogo Cão, em Sá da Bandeira,
actualmente Lubango, e Universidades de Genebra, Lausanne e Friburgo (Ciências
Sociais e Políticas). Evangélico Congregacional.
4. O
Nacionalismo Angolano e a Política Portuguesa
O Nacionalismo Angolano nasceu no seio de um
grupo social muito específico, o grupo em Angola equivalia ao que no Estado da
Índia é conhecido pela designação de casados, e no Estado do Brasil
pela de mazombos.
Quem são então os casados,
os mazombos, os ambaquistas, os luandinos,
os malanjinos, os chicoronhos, os angolenses?
Simples, são os filhos-da-terra!
São os portugueses que se fixaram, casaram,
criaram filhos e netos. São os locais que adoptaram as língua e cultura
portuguesas. São os descendentes de uns e de outros.
A este grupo, o dos Lusos-filhos-da-terra,
opôs-se por vezes o grupo dos Lusos-filhos-do-reino, designado por reinóis
na Índia, mascates no Brasil e metropolitanos em
Angola.
O que aconteceu então?
Várias coisas:
O Reino de Portugal aboliu o tráfico negreiro
em 1836, o que prejudicou gravemente a economia dos Reinos de Angola e de
Benguela, cuja principal exportação eram as peças, os escravos,
prejudicou os potentados banto-tribais do interior africano, que forneciam os
escravos, e prejudicou os lusos-filhos-da-terra, que as exportavam
para as Américas espanhola, francesa, inglesa e portuguesa.
Tal prejuízo económico originou grande
descontentamento, descontentamento que se manifestou politicamente através de
tendências independentistas, autonomistas ou de aproximação ao Império do
Brasil.
Aproximadamente a partir da mesma data teve
início a Corrida a África, que envolveu inicialmente a França e a
Inglaterra, depois também a Alemanha e a Bélgica, que culminou no Ultimato
Britânico de 1890 e na Conferência de Berlim de 1884 e1885, e que acarretou a
passagem para a influência alemã, belga, francesa e inglesa de zonas anteriormente
sob influência portuguesa.
Da Conferência de Berlim decorreu que as
potências ficavam obrigadas a comprovar a efectiva ocupação dos territórios
africanos que reclamavam, o deu origem, no fim do século XIX início do século
XX, às Campanhas de Ocupação e Pacificação de Angola e de Moçambique, campanhas
que obrigaram á deslocação para esses territórios de forças metropolitanas
relativamente importantes.
Também aproximadamente a partir da mesma data
começaram a surgir em Portugal os adeptos da superioridade racial germânica,
ideologia que em termos de política colonial privilegiava os lusos-filhos-do-reino
e desprivilegiava os lusos-filhos-da-terra, que aliás não
distinguia dos banto-tribais (eram todos pretos), ideologia que teve uma grande
influência na política colonial da I República (1910-1926), da Ditadura Militar
(1926-1933) e da primeira metade do Estado Novo (1933-1953).
Qual era pois a situação dos lusos-filhos-da-terra de
Angola, Cabo-Verde, Guiné, Índia, Macau, São Tomé e Príncipe, Timor, nas
décadas de 1920, 1930, 1940?
Tinham sido economicamente prejudicados,
tinham sido desapossados dos governos locais de que tradicionalmente se
encarregavam, tinham sido desconsiderados por via da sua identificação com os
banto-tribais (eram todos pretos).
Acho que não devemos ficar espantados por
alguns se terem revoltado…
Este é, no meu entendimento, a perspectiva
geral.
Depois há os detalhes, os pormenores, os
casos pessoais. Uns trágicos, como os da Sita Valles, do Jonas Savimbi, de
muitos outros, que morreram em combate. Outros menos trágicos, como os do
Joaquim Pinto de Andrade, do José Eduardo dos Santos, também de muitos outros,
que sobreviveram ao temporal e permaneceram em Angola. E há ainda o dos que
fora de Angola também sobreviveram.
Paulo Jorge de Sousa Pinto,
Os casados de Malaca, 1511-1641:
estratégias de adaptação e de sobrevivência.
Adelto Gonçalves,
A Revolta dos Mazombos Pernambucanos.
Evaldo Cabral de Mello,
A Fronda dos Mazombos: Nobres contra
Mascates, Pernambuco, 1666-1715.
Evaldo Cabral de Mello,
A Fronda dos Mazombos: Nobres contra
Mascates, Pernambuco, 1666-1715.
António Gusmão,
Os Mazombos e o Pai Sumé do Peabiru.
Decreto de abolição da escravatura (Visconde
de Sá da Bandeira, 1836)
5. Os
Mucancalas
distribuição geográfica dos
Khoe-San, ou Khoisan.
Duas citações do artigo da Revista VEJA
abaixo referido:
«A pesquisa mostrou que os Khoe-San
são descendentes do mais antigo evento de diversificação da história humana,
que teria acontecido há 100.000 anos, e conservam até hoje essas diferenças
ancestrais em seu DNA. O estudo foi publicado nesta quinta-feira na revista
Science.»
«O que conseguiram confirmar foi o
carácter único dos Khoe-San, que teriam se separado do resto da humanidade há
100.000 anos e seguido seu desenvolvimento de forma quase independente. A
segunda divergência a ser registrada pelos pesquisadores só aconteceu bem
depois, há 45.000 anos, quando os povos do centro da África se separaram dos
povos ao leste. “A maior divergência entre os humanos modernos aconteceu há
100.000 anos, bem antes da migração da África, e duas vezes antes das
divergências entre os pigmeus e os caçadores-colectores do leste da África do
resto dos grupos africanos”, disse Carina Schlebusch, pesquisadora da
Universidade Uppsala, na Suécia.»
Os Khoe-San, ou Khoisan, que vivem em Angola
são aí conhecidos por Mucancalas.
VEJA: Cientistas analisam DNA de mais antiga
linhagem de humanos
SCIENCE: Genomic Variation in Seven Khoe-San Groups Reveals Adaptation
and Complex African History in Science 19 October 2012,
Published Online September 20 2012
Khoisan
Línguas khoisan
Khoisan languages – map
Khoisan languages – tree
As Comunidades Primitivas de Caçadores e
Recolectores (Khoisan)
Angola's Tribes: The Historic Khoisan People
The Khoisan
The Khoisan Speakers
6. Os
Bantos
expansão Banto (2000
aC - 2000 dC).
Ao contrário dos Mucancalas, que são
relativamente homogéneos quer do ponto de vista da antropologia física quer do
da antropologia cultural, os Bantos são bastante não homogéneos, chegaram ao
território que actualmente é o de Angola vindos uns do Norte, outros do Leste,
outros do Sul, e em diversas épocas, nalguns casos já depois da chegada dos
Lusos.
6.1. Reino do Congo
Em 1483 Digo Cão contactou o Reino do Congo e
visitou o Mwene Kongo Nzinga-a-Nkuwu em M'Banza Kongo, a sua capital.
É pois indubitável que os Congos já então
habitavam o baixo curso do rio Zaire e estavam politicamente organizados num
reino.
Na sequência desta visita Diogo Cão deixou
homens seus no Congo e trouxe nobres congos a Portugal. Em 1485 esses nobres
regressaram ao Congo, tendo então sido acordado aliar os dois reinos.
Em 1491, Gonçalo de Sousa foi mandado ao Congo à frente de
uma Embaixada do Rei João II de Portugal, embaixada essa que incluía artífices,
missionários, soldados, armas e cavalos (uma verdadeira missão de cooperação
cultural, económica e militar), tendo então sido baptizado o Manicongo (com o
nome de João) e todos os principais nobres. Gonçalo de Sousa foi substituído pelo seu sobrinho Rui de Sousa em Cabo Verde pela sua morte de doença de grassava a bordo juntamente com alguns fidalgos incluindo o célebre caçuta, familiar do rei do Congo.
Este João I do Congo faleceu em 1506,
tendo-lhe sucedido o filho, Mvemba-a-Nzinga ou Afonso I (ca. 1456 –
1542 ou 1543), que terá disputado a sucessão com o seu meio-irmão
Mpanzu-a-Kitima, tendo nesse conflito sido apoiado pela missão portuguesa.
Afonso I empenhou-se na implantação da Igreja
Católica Romana no Congo, tendo para isso enviado um filho para Portugal.
Henrique, o filho, foi educado, ordenado sacerdote, sagrado bispo titular de
Útica (In partibus) em 1518, voltou ao Congo em 1520 e lá faleceu em
1531, em vésperas de partir para o Concílio de Trento, em Roma.
Os 25 ou 26 anos entre o falecimento de
Afonso I do Congo (1542 ou 1543) e a entronização de Álvaro I (1568) foram anos
de instabilidade decorrente de:
Conflitos sucessórios, em que por vezes
intervieram a Igreja e Portugal.
Conflitos fronteiriços com alguns potentados
subordinados, ou tributários.
Conflitos com Portugal, decorrentes dos
abusos cometidos pelos comerciantes de São Tomé, os Tomistas, que
embora súbditos portugueses não respeitavam os acordos estabelecidos entre Portugal
e o Congo, tendo chegado mesmo a fazer eleger um rei, Afonso II, que lhes era
favorável.
Um dos conflitos entre o Congo e os seus
tributários envolveu o Andongo, reino que se tornou independente em 1556, na
sequência de uma campanha infeliz de Diogo I do Congo.
A um quarto de século de instabilidade
interna seguiu-se meio século de estabilidade, interna não externa, os reinados
de Álvaro I do Congo (1568 – 1587) e de seu filho Álvaro II (1587 – 1614),
período em que ocorreu a invasão dos Jagas e a fundação de Luanda.
A invasão dos Jagas (ca. 1569)
foi repelida por forças conjuntas do Congo e de Portugal sob o comando de
Francisco de Gouveia Sottomaior. Da fundação de Luanda (1576) tratarei
seguidamente.
6.2. Reino de
Angola
Em 1560 Paulo Dias de Novais integrou,
juntamente com missionários jesuítas, uma Embaixada de Portugal ao Reino do
Andongo, independente desde 1556, e então governado pelo Angola Quiluanje.
Estando na Corte do Rei do Andongo, e por
motivos que ainda não percebi muito bem, foi preso em data desconhecida,
ajudado por uma princesa filha do Angola Quiluanje, libertado em 1565 ou 1566,
e assumiu o compromisso de voltar a Portugal para arranjar socorro militar para
o pai da princesa, que estaria a ser atacado por um rival poderoso.
Paulo Dias de Novais regressou realmente a
Lisboa, conseguiu que Sebastião I de Portugal o designasse, através de uma
Carta de Doação de 1571, «Governador e Capitão-Mor, conquistador e
povoador do Reyno de Sebaste na Conquista da Etiópia ou Guiné Inferior»,
voltou a partir em 1574, desembarcou na Ilha das Cabras (actual Ilha de Luanda,
então território do Rei do Congo) em 1575, tendo lá encontrado portugueses
estabelecidos há alguns anos, uns, refugiados dos Jagas.
Quase cinco meses após o desembarque recebeu
permissão do novo Rei do Andongo, o Angola Quiluanje Quiassamba, para se mudar
para terra firme, o que fez, tendo-se estabelecido no morro de São Paulo, onde
a 25 de Janeiro de1576 fundou São Paulo de Loanda.
Seguem-se novas confusões envolvendo os
Reinos do Andongo, do Congo e de Portugal, confusões que também ainda não
percebi muito bem, acabando Paulo Dias de Novais por vir a falecer e a ser
sepultado, em 1589, na vila de Nossa Senhora da Vitória de Massangano, povoação
por ele fundada em 1583.
6.3. Reino de
Portugal
Enquanto tudo isto se passava a Sul, no
Andongo e no Congo, a Norte, em Marrocos e em Portugal:
Sebastião I de Portugal morria na Batalha de
Alcácer-Quibir (1578).
Henrique I de Portugal, seu sucessor e tio-
bisavô, morria de velho (1580).
Filipe II de Espanha tornava-se Rei de
Portugal (1580).
Os navios portugueses eram integrados na
esquadra reunida por Filipe II de Espanha, Filipe I de Portugal, para ir
reivindicar o Trono da Inglaterra (Invencível Armada, 1588).
Portugal era envolvido na guerra que opunha a
Espanha às Sete Províncias Unidas dos Países Baixos (1595), guerra que é
conhecida por Guerra dos Oitenta Anos ou Revolta Holandesa.
O envolvimento de Portugal na Guerra dos
Oitenta Anos desencadeou a Guerra Luso-Holandesa ou Luso-Neerlandesa (1595 –
1693), o primeiro conflito global (combateu-se do Brasil ao Japão), conflito no
qual as Guerras Angolanas, ou Guerras da Ginga, se integram e são um importante
episódio.
Temos portanto que desde a chegada de Diogo Cão
(1483) ao falecimento de Paulo Dias de Novais (1583) decorreram exactamente cem
anos, um século em que Portugal foi governado por reis portugueses.
Do falecimento de Paulo Dias de Novais (1583)
ao falecimento da Rainha Ginga (1663) decorreram oitenta anos, oitenta anos em
que Portugal foi governado por reis espanhóis durante sessenta.
Isto é importante porque:
A União Ibérica, o governo dos reis
espanhóis, voltou contra Portugal os inimigos de Espanha, particularmente a
Inglaterra e a Holanda, potências que anteriormente eram suas aliadas.
Nos séculos XVI e XVII a política ultramarina
portuguesa baseava-se no comércio – o que era importante eram as especiarias
que a Carreira da Índia anualmente desembarcava em Lisboa,
especiarias que eram seguidamente revendidas na Flandres, via Antuérpia, e na
Itália, via Génova.
Nos séculos XVI e XVII a política ultramarina
espanhola baseava-se no saque – o que era importante era a prata e o ouro que
a Flota de Indias anualmente desembarcava em Sevilha, prata e
o ouro que que eram seguidamente usados no pagamento dos Exércitos de Itália e
de Flandres.
A Espanha tinha em vigor os Estatutos
de Limpieza de Sangre, uma legislação que descriminava positivamente
os cristãos-velhos nascidos em Espanha, negativamente os cristãos-novos, os
cristãos-velhos não nascidos em Espanha e todos os mestiços.
Não tendo embora os Estatutos vigorado
em Portugal e seu Império, o certo é que influenciaram a política portuguesa no
século XVII, particularmente na época da União Ibérica, tendo-se a sua
influencia estendido ao longo dos séculos subsequentes, embora de forma cada
vez mais esbatida.
6.4. Resumo
conclusivo
O contacto de dois séculos entre os
portugueses e os povos bantos com acesso á costa – os Quicongos em Santo
António do Zaire (antiga Mpinda, actual Soyo), os Quimbundos em São Paulo da
Assunção de Loanda, os Ovimbundos em São Filipe Benguela – acarretou uma
aculturação mútua, complexa e ainda mal estudada, com duas componentes que
pretendo destacar:
Adquiriram uma tecnologia militar que os
povos do interior não possuíam.
Tiveram acesso a mercadorias exóticas que
podiam comerciar no interior.
A aquisição da tecnologia militar permitiu
aos povos bantos da costa hegemonizarem-se face aos do interior. O acesso às
mercadorias exóticas permitiu-lhes estabelecer rotas comerciais que chegavam
aos Grandes Lagos e ao Índico. Nestes dois processos, quanto sei ainda pouco
estudados, os Ambaquistas, Bienos, Cassanjes, Zombos, parecem ter sido
importantíssimos actores.
Em termos políticos esta situação deu origem
à conhecida configuração do início do século XIX na costa os Reinos do Luango,
do Congo, de Angola e de Benguela, no interior os Reinos do Anzico, da Matamba,
de Cassanje, do Planalto Central, do Sudoeste, mais para o interior ainda a
Lunda e o Barotse – configuração que se alterou com a Corrida a África,
ocorrida entre 1840 e 1920, conjunto de eventos a que esteve subjacente uma
nova tecnologia militar, a tecnologia dos revólveres, das carabinas de
repetição e das metralhadoras.
o reino de Garanganja e as principais rotas comerciais em 1890.
Na figura acima um mapa do Sul da África
Central em 1890,mostrando a posição do Reino da Garanganja (Msiri’s Kingdom),
as suas principais rotas de comércio, os territórios aproximados dos seus
principais aliados (nomes a amarelo) e as áreas de influência aproximadas das
potências europeias (nomes a laranja). Não são mostradas a área de influência
da França, nem a da Alemanha, nem as dos restantes potentados africanos. O
Muatiânvua estava a imediatamente a ocidente da Garanganja, e eram inimigos.
Nota:
As Histórias dos Reinos do Congo, Angola e
Benguela, entre a chegada de Diogo Cão, em 1483, e o falecimento da Rainha
Ginga, em 1663, são polémicas porque, a meu ver:
As fontes primárias são escassas.
As fontes primárias escritas são difícil
interpretação por quem:
Não conheça bem os costumes e crenças banto.
Não conheça bem a História de Portugal e do
seu Império, a político-militar, a económico-social, a ideológico-religiosa, a
cultural e das mentalidades.
Os historiadores calvinistas e marxistas
identificaram o Angola Quiluanje e a Rainha Ginga sendo como resistentes
anticolonialistas e elaboraram as suas narrativas com base nesta
identificação.
A Republica Popular de Angola adoptou as
narrativas referidas no ponto anterior e transformou-as em História
Oficial de Angola.
Referências:
História e Cultura: Os Guerreiros Jaga in Ritos de Angola
Ptolomeu e Duarte
Lopes:
do imaginário à realidade
Reino dos Quiocos: Chokwe(etnia)
Olhares distanciados: O Sangue Kwanyama em três versões coloniais
Vátuas, ou Angunes – São um ramo dos Zulos.